Considerações Gerais
A craniotomia interhemisférica
anterior ou posterior fornece acesso aos espaços parafalcinos
e paraventriculares profundos através da fissura interhemisférica natural. Embora trabalhar nesse plano
natural tenha inúmeros benefícios, como uma necessidade de mínima retração
cerebral, o campo operatório pode ser profundo e estreito, tornando a cirurgia
nesta região tecnicamente desafiadora. Esta craniotomia
está situada ao redor da sutura coronal (quando se usa uma via interhemisférica frontal) ou atrás do lóbulo central
(quando se usa a via interhemisférica parietal
superior) para proteger os córtex sensoriais e as numerosas veias dominantes parassagitais, que são tipicamente 3-4 cm posteriores à
sutura coronal.
Sacrificar as grandes veias ponte parassagitais
pode levar a infarto venoso e
hemiparesia. Os afastadores fixos devem ser evitados através do uso de retração
dinâmica ou induzida pela gravidade (com o paciente em posição lateral) e
drenagem precoce do líquor (LCR) (por meio de dreno
lombar ou ventriculostomia) para mobilizar o
hemisfério para longe da linha média.
Modificações da via interhemisférica
podem expandir o estreito corredor cirúrgico dessa via.
Figura 1: A via transfalcina contralateral (em verde) oferece ângulos mais
flexíveis para lesões que se estendem lateralmente. Essa modificação da via interhemisférica ipsilateral
reduz a retração no hemisfério ipsilateral (zona vermelha) ao atingir o polo
lateral do tumor. (Imagem cortesia do The Neurosurgical Atlas).d
Neste artigo, destacarei nuances técnicas para
otimizar a abordagem interhemisférica e suas
modificações.
Indicações para a Abordagem
As patologias típicas manejadas
através dessa abordagem incluem meningiomas parafalcinos, gliomas hemisféricos
de linha média, aneurismas distais da cerebral anterior, metástases, malformações arteriovenosas e tumores dentro e
perto da parte anterior do terceiro ventrículo, como cistos colóides,
hamartomas hipotalâmicos e craniofaringiomas.
Para tumores do terceiro
ventrículo localizados mais posteriormente, a craniotomia é centrada sobre a
sutura coronal e uma calosotomia mais posterior é necessária. Tumores talâmicos
posteriores e da região pineal com extensão predominantemente superior também
são candidatos razoáveis para a via interhemisférica transcalosa posterior intervenosa
(trabalhando em torno das veias cerebrais internas).
O uso dessa abordagem para
acessar um aneurisma de pericalosa depende da
localização do aneurisma em relação ao joelho do corpo caloso. Para aneurismas
abaixo do joelho, uma via interhemisférica é
preferida, a fim de garantir o controle proximal.
A visão lateral da abordagem interhemisférica é
limitada, e não aconselho seu uso para lesões que afetam principalmente o
tálamo ipsilateral ou núcleo caudado. Prefiro as abordagens interhemisféricas contralaterais ou ipsilaterais
transcorticais para tais lesões localizadas lateralmente.
Considerações pré-operatórias
Para tumores grandes como meningiomas
parafalcinos, a drenagem intraoperatória
do LCR facilita o relaxamento cerebral e a mobilização do tumor e sua devascularização ao nível da foice interhemisférica
no início da cirurgia. Um dreno lombar é o método de escolha
para este fim, pois as cisternas basais e os ventrículos muitas vezes não são facilmente
acessíveis durante a dissecção da fissura interhemisférica.
O seio sagital
superior e suas veias ponte correspondentes devem ser avaliados por meio de RNM
pré-operatória e, se necessário, deve ser realizado uma angioressonância ou angiotomografia.
Embora as estruturas venosas envolvidas ao longo do terço anterior do seio
sagital sejam consideradas seguras para serem ligadas, o risco de infarto
venoso significativo persiste. Portanto, a manipulação e a ligadura dessas
estruturas venosas devem ser mantidos ao mínimo.
Se houver grandes veias parasagitais drenando para o
seio sagital superior no caso de um tumor parafalcino,
é desaconselhável ligar essas veias; em vez disso, uma abordagem interhemisférica transfalcina contralateral
pode ser uma opção. Meningiomas parafalcinos
normalmente não requerem ligadura do seio sagital superior, mas se forem
encontrados infiltrados no seio, as precauções para evitar e/ou manejar a
embolia aérea são obrigatórias.
Em pacientes com tumores grandes, manitol 1g/kg é administrado
durante a incisão. Se houver um dreno lombar disponível, 30-40ml de líquor é drenado gradualmente durante a craniotomia.
Anatomia Cirúrgica
A
compreensão da anatomia venosa parasagital é
importante para a execução dessa abordagem.
Figura 2: Demonstra-se uma visão
coronal não-operatória da trajetória cirúrgica para o corredor interhemisférico
em direção aos alvos cirúrgicos profundos da linha média. Importantes
estruturas de referência incluem o cingulum (1), corpo
caloso (2) e fornices (3). As estruturas
cerebrovasculares em cada nível de dissecção devem ser cuidadosamente
preservadas. As veias profundas diencephalicas são de especial importância para
evitar a morbidade cirúrgica. (Imagem cortesia do The Neurosurgical Atlas).
Figura 3: A anatomia venosa ao
redor da sutura coronal. As veias parasagitais são esparsas antes da sutura
coronal. Portanto, uma craniotomia interhemisférica, principalmente anterior à
sutura, evita essas veias importantes. Uma grande veia ponte apenas posterior a
esta sutura drena os lóbulos frontais (Imagens cortesia de AL Rhoton Jr). (Imagem cortesia do The Neurosurgical
Atlas).
Figura 4: Visão superior da
fissura interhemisférica. O lobo frontal direito é rebatido lateralmente para
expor os ramos distais bilaterais de artéria cerebral anterior (A.C.A.) e o corpo
caloso, que é branco brilhante em comparação com o córtex cingulado (imagens
superiores). Os córtex do cíngulo bilateral podem ser
muito aderentes uns aos outros e podem ser confundidos com o corpo caloso. A artéria calosomarginal pode
ser usada como um guia (landmark) para alcançar as
artérias pericalosas. Observe que essa visão (terceira
imagem) foi alcançada sem sacrificar nenhuma veia ponte, mas em vez disso, liberando-a
de suas membranas aracnoides circundantes. A calosotomia
permite a exposição do ventrículo (quarta imagem)(Imagens cortesia de AL Rhoton Jr). (Imagem cortesia do The Neurosurgical
Atlas).
CRANIOTOMIA INTERHEMISFÉRICA
Figura 5: O paciente pode ser colocado em posição supina ou decúbito lateral.
A posição supina orienta mais facilmente o cirurgião para as estruturas da
linha média (imagem inferior direita), enquanto a posição lateral (imagem
inferior esquerda) permite que a gravidade mobilize o hemisfério dependente
(ipsilateral). No caso de um aneurisma de pericalosa,
a cabeça do paciente é estendida para alcançar o controle proximal entre a
artéria comunicante anterior e o joelho do corpo caloso. No caso de um tumor, a
lesão deve ser posicionada o mais alto possível dentro do campo cirúrgico. (Imagem
cortesia do The Neurosurgical Atlas).
Figura 6: Flexionar ligeiramente o
cabeça é razoável para um aneurisma de pericalosa
logo acima do nível do joelho (imagem esquerda). A localização da lesão em
relação ao joelho do corpo caloso determina o grau de extensão do pescoço. Um cisto
coloide no forame de Monro
é acessível através da abordagem transcalosa (imagem
direita). A via transcalosa proporciona uma visão
panorâmica do plexo coróide e das veias cerebral
interna e talamoestriada. (Imagem
cortesia do The Neurosurgical Atlas).
Figura 7: Para
a abordagem interhemisférica anterior, a incisão é
feita de forma curvilínea (azul) ou em ferradura (verde) atrás da linha de
implantação do cabelo. A localização da incisão linear é determinada pela
localização exata da lesão. A incisão em ferradura está um terço posterior e
dois terços anterior à coronal e cruza a linha média. A remoção
do osso sobre o seio sagital superior permitirá a sua mobilização lateral
usando suturas de retração no foice interhemisférica
para expandir a visão interhemisférica. Para tumores
maiores, uma incisão em forma de U é mais apropriada. Observe a localização dos
pinos do suporte de cabeça no crânio. (Imagem cortesia do The Neurosurgical Atlas).
Figura 8: Uma craniotomia paramediana direita é delineada para aneurismas de pericalosa (imagem esquerda) ou pode ser aplicada para
tumores intraventriculares (imagem direita). A neuronavegação é útil no
planejamento da craniotomia e da calosotomia. Observe que os orifícios de trepanação
são colocados sobre o seio sagital, e a largura do seio é parcialmente exposta
para permitir a rotação suave do seio dural após a abertura dural. (Imagem
cortesia do The Neurosurgical Atlas).
Figura 9: Depois de completar dois
orifícios de trepanação sobre o seio, uso um dissetor
(p. ex. penfield) para separar generosamente a dura
da tábua interna da calvária sob a craniotomia e especialmente sobre o seio. O
último corte ósseo é feito ao longo do seio para permitir a elevação oportuna
do flap se ocorrer lesão ao seio. Grandes tiras de surgicel ou gelfoam devem
estar disponíveis para cobrir o seio para hemostasia. A drenagem do líquor permite que o seio e a dura se afastem da tábua
interna e previne lesões de seio ou de dura não intencionais. (Imagem cortesia
do The Neurosurgical Atlas).
Figura 10: A dura é aberta em
forma de U com base no seio sagital (imagem da esquerda, paciente em posição
supina). As suturas de retração no foice interhemisférica
superior giram o seio venoso lateralmente e expandem o alcance
interhemisférico. Algumas pequenas veias de ponte podem ser sacrificadas, mas
as maiores devem ser preservadas. Observe que a retração da gravidade facilita
a mobilização do hemisfério dependente para longe da linha média (posição
inferior de imagem lateral).
Figura 11: A porção subdural da
dissecção é completada ao longo do foice interhemisférica
e a artéria calosomarginal ipsilateral
é traçada ao longo da linha média até o nível do cíngulo (imagem a esquerda).
Esta artéria definirá os planos de dissecção da linha média para que o
cirurgião possa evitar lesões subpiais nos córtex aderentes
do cíngulo através de técnicas microcirúrgicas (imagem a direita). (Imagem
cortesia do The Neurosurgical Atlas).
Figura 12: Observe a diferença de
cor entre o giro do cíngulo (seta pequena) e o corpo caloso (seta grande). Giros
do cíngulo muito aderentes podem ser confundidos com o corpo caloso. O corpo
caloso é branco brilhante e se destaca do tecido cortical circundante. A
liberação de LCR do dreno lombar facilitará essa dissecção interhemisférica. O cirurgião
deve observar as artérias pericalosas e evitar lesa-las
inadvertidamente com a ponta das microtesouras. (Imagem
cortesia do The Neurosurgical Atlas).
Figura 13: O corpo caloso é
amplamente exposto na linha média entre as artérias pericalosas.
As traves aracnoides aderentes aos cíngulo são amplamente divididas
anteriormente e posteriormente para minimizar a retração nos hemisférios mediais.
Às vezes, as artérias pericalosas podem ser
deslocadas para um lado ou também podem ficar aderidas, dificultando sua
separação. (Imagem cortesia do The Neurosurgical
Atlas).
Figura 14: No caso de um cisto
coloide,uma calosotomia de 1,5 cm proporcionará ampla
visualização do forame de Monro e das veias coroidea,
cerebrais internas e talaestriadas. A neuronavegação
auxilia a localização precisa da calosotomia. Se o
septo pelúcido hernia no campo de visão e obstrui a
visualização intraventricular, sua fenestração limpará a visão. Esta protrusão
é causada por obstrução biventricular ao nível do forame de Monro.
(Imagem cortesia do The Neurosurgical Atlas).
Figura 15: Demonstram-se as etapas
através da via interhemisférica em direção às cisternas
da linha média. Observe o corte sagital na imagem a esquerda. É fácil para o
cirurgião ficar perdido e ir muito anteriormente ou posteriormente (setas) ao
longo da cisterna interhemisférica. A neuronavegação ajuda
a evitar isso. As linhas demarcadas correspondem aos níveis de referência na
ilustração coronal (imagem a direita). Esses níveis incluem o giro do cíngulo
(1), corpo caloso (2) e fornices (3). Se o cirurgião
não estiver com o centro de dissecção direcionado para o alvo cirúrgico, posteriormente
é necessária abertura adicional dos tecidos normais para redirecionar o centro
de dissecção. (Imagem cortesia do The Neurosurgical
Atlas).
Figura 16: Se o hemisfério contralateral deve ser acessado, faço uma
incisão em forma de T na foice interhemisférica e fixo
as pontas da foice usando suturas de tração (imagem de entrada). Esta via
transversal (seta verde) expande os ângulos de visão laterais. O esboço acima
mostra a abordagem interhemisférica transfalcina transprecuneus posterior
para atingir lesões dentro do átrio. (Imagem cortesia do The Neurosurgical Atlas).
Fechamento
Uma vez feita a hemostasia, a dura é fechada de forma hermética.
O surgicel ou gelfoam no
seio sagital superior não deve ser removido. Um cateter ventricular pode ser
necessário brevemente durante o pós-operatório para limpar detritos
ventriculares se os ventrículos foram violados/abertos durante a cirurgia.
Considerações pós-operatórias
Os pacientes são observados na Unidade de Terapia
Intensiva por 1 ou 2 dias antes de serem transferidos para as enfermarias. A
hipertensão e a medicação excessiva com narcóticos devem ser evitadas. O
cateter de ventriculostomia geralmente é removido no 2º dia pós-operatório.
Este artigo é uma tradução do artigo Interhemispheric Craniotomy do site The Neurosurgical Atlas. Agradecemos imensamente a contribuição do Dr Aaron
Cohen Gadol. As lindas imagens de dissecções
anatômicas disponíveis são da The Rhoton Collection®. Todos
os créditos das imagens são da Courtesy of the Rhoton
Collection, American Association of Neurological Surgeons (AANS)/Neurosurgical
Research and Education Foundation (NREF).